Debate indica que execução falha de medidas protetivas aumenta a violência
A senadora Augusta Brito destacou que o Oficial de Justiça é fundamental na rede de enfrentamento à violência doméstica, uma vez que é responsável pelo cumprimento de medidas protetivas e afastamentos de agressores dos lares
Um dos instrumentos previstos na Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06), a medida protetiva de urgência nem sempre é cumprida a tempo de garantir a proteção das vítimas de violência doméstica. O acúmulo de processos em tribunais e a dificuldade em localizar e intimar os agressores são alguns dos desafios para garantir uma redução de casos de agressão e morte de mulheres, conforme apontaram participantes de audiência pública promovida pela Comissão de Direitos Humanos (CDH) no dia 28 de novembro.
No debate intitulado “Lei Maria da Penha: ausência de dados referentes à atuação dos Oficiais de Justiça”, também foi apontada a necessidade de coleta e sistematização dos dados sobre a violência doméstica a fim de auxiliar o Poder Público a conhecer as reais necessidades das vítimas.
Autora do pedido de audiência, a senadora Augusta Brito (PT-CE) destacou que o Oficial de Justiça é fundamental na rede de enfrentamento à violência doméstica, uma vez que é responsável pelo cumprimento de medidas protetivas e afastamentos de agressores dos lares. Ela apontou que capacitar esses profissionais de forma contínua, aperfeiçoar a legislação e criar políticas públicas baseadas em dados são alguns dos caminhos para reduzir os índices de violência doméstica e feminicídio.
— Não adianta só você ter a emissão da medida protetiva se o oficial não consegue entregá-la com um tempo hábil. O monitoramento dessa medida protetiva é necessário também para garantir que a mulher não sofra novamente a violência e aconteça o feminicídio, sobretudo. Nós sabemos que a violência vai chegar até, infelizmente, o feminicídio se ela não for parada, barrada e controlada, enfim, na sua fase de andamento, porque ela começa desde a violência psicológica, violência material, patrimonial e violência sexual — disse.
Congestionamento
De acordo com o relatório Avaliação sobre a Aplicação das Medidas Protetivas, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 30% dos tribunais ainda têm um “congestionamento” na análise das medidas protetivas.
—Então, passam as 48 horas, 30% delas ainda não foram analisadas. Não pode ter esse congestionamento não analisado. O tempo do processo, para nós do Conselho Nacional de Justiça, significa proteção para as mulheres — prevenção e proteção — disse a juíza auxiliar da presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Luciana Lopes Rocha.
A juíza reforçou a necessidade de atualização permanente dos dados das vítimas e dos agressores para o cumprimento das medidas protetivas e também de dados sobre o perfil da violência.
— Só em 2022, foram cumpridos 1,3 milhão de mandados sobre medida protetiva de urgência, dos quais 745 mil foram entregues aos destinatários (58%), foram cumpridos com sucesso, e 232 mil foram devolvidos em razão do não cumprimento dessa diligência. Nós temos, aqui, que chamar a atenção para a importância de dados atualizados no processo. Enquanto juíza titular de violência doméstica e familiar, em toda audiência, em todo contato com as partes, precisamos perguntar: Qual é o seu endereço atualizado? Qual é o seu telefone atualizado? E os oficiais de Justiça também têm sempre que trazer essa informação — alertou.
Demora
A diretora do Sindicato dos Oficiais de Justiça do Estado do Ceará (SINDOJUS-CE), Fernanda Garcia Gomes, afirmou que o lapso entre o pedido da medida protetiva e a chegada da decisão para o cumprimento pelo oficial de justiça pode deixar a vítima exposta a mais violência:
— A gente observa, em alguns momentos, que a decisão demora para chegar na mão do oficial de justiça. Entre a decisão proferida pelo magistrado e a sua real execução, o cumprimento do mandado, há um lapso aí, há uma distância. E a gente acredita, assim como com os juizados especiais, com as varas especializadas, também é preciso centrais especializadas, em que esses servidores, esses oficiais de justiça, vão poder otimizar essa distância entre a decisão e a execução, vão poder ser qualificados, treinados, para poder ter um acolhimento dessa vítima — avaliou.
Um dos autores do livro “Feminicídio: mapeamento, prevenção e tecnologia“, o juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE) e pesquisador Tiago Dias da Silva apontou que a coleta de dados sobre os casos pode ajudar na construção de políticas públicas mais eficazes:
— Conforme os dados que apuramos do Proteção na Medida, em torno de 10% das vítimas, mesmo com medida protetiva vigente, sofrem uma revitimização. Então, o nosso propósito, como Poder Judiciário, é zerar esse índice de revitimização. É garantir que aquelas que realmente busquem o poder público possam ter um acompanhamento de acordo com as suas necessidades, que evite que esse agressor efetivamente venha a praticar uma nova conduta — argumentou.
*Com informações da Agência Senado