Em defesa da vida

Oficiais de Justiça destacam a importância de ser criada uma política institucional voltada à saúde mental

Participantes da palestra em Quixadá parabenizaram o Sindojus pela iniciativa de realizar esse trabalho de caráter preventivo e destacaram a importância de esse diálogo ser feito, em caráter permanente, pelo TJCE

17/08/2022
Palestra que debateu a preservação da saúde mental e da vida nas carreiras jurídicas foi realizada, no dia 15 de junho, em Quixadá. Fotos: Luana Lima/Sindojus Ceará

O ritmo frenético do cotidiano acaba consumindo todo o tempo das pessoas, que na ânsia de darem conta das inúmeras e cada vez mais crescentes demandas da vida acabam negligenciando um cuidado importante: com a saúde mental. Muitas vezes até há um cuidado com o físico, mas a saúde da mente acaba ficando em segundo plano e uma hora o corpo responde. Para debater esse tema tão importante, o Sindicato dos Oficiais de Justiça do Ceará (Sindojus-CE) realizou, no dia 15 de junho, em Quixadá, palestra com o tema “A preservação da saúde mental e da vida nas carreiras jurídicas: um debate urgente”. Os participantes parabenizaram a entidade pela iniciativa de realizar esse trabalho de caráter preventivo e destacaram a importância de esse diálogo ser feito, em caráter permanente, pelo Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE).

Roberto Galino, da comarca de Maracanaú, que integrou a comitiva de 32 oficiais e oficialas que foram a Quixadá prestigiar o evento, elogiou o sindicato por dar esse primeiro passo e fomentar esse debate, uma vez que se trata de uma área que realmente precisa de prevenção. E ressaltou a importância de esse trabalho ser feito pelo Tribunal de Justiça, para que servidores e magistrados possam ter um equilíbrio entre todas as áreas de suas vidas: a profissional e familiar.

“Infelizmente, principalmente no nosso cargo, está havendo uma sobrecarga muito grande, com pressão e cobranças que acabam acarretando todo um prejuízo físico, mental e familiar, então a gente precisa ter esse equilíbrio e, para que a gente alcance esse equilíbrio, temos que cuidar realmente de todas as áreas, inclusive, a prevenção da saúde mental”, disse.

Uma comitiva formada por 32 oficiais e oficialas de Justiça foi a Quixadá prestigiar o evento

Vivendo no automatismo

A oficiala de Fortaleza, Francisca Gomes, considera importante debater o tema e reforça que a categoria realmente está sobrecarregada, trabalhando sob cobrança. “A gente se preocupa em dar essa resposta e na maioria das vezes se esquece de olhar para si. O cansaço mental é imenso, mas, ainda assim, continuamos naquele automatismo de tentar dar conta e cumprir uma grande demanda. Chega um estágio que o corpo começa a sinalizar, então é importante debater esses assuntos para que a gente possa parar e se observar. Em via de regra, todo mundo está afetado de alguma forma, porém, fechamos os olhos para essa realidade, mas pode chegar o momento em que essa situação se torne mais difícil de ser revertida e podemos perdemos o controle da situação”, observa.

Ela acrescenta que parar para falar sobre saúde mental é também ter um olhar para si, um olhar necessário, que no dia a dia as pessoas não costumam fazer. “Quando vem de forma coletiva, institucionalizada, a gente se sente um pouco acolhido nessa questão, de ter esse olhar e conseguir se ver”, complementou.

“Quando (esse apoio) vem de forma coletiva, institucionalizada, a gente se sente um pouco acolhido nessa questão, de ter esse olhar e conseguir se ver”, frisa a oficiala Francisca Gomes

Ausência de suporte

Davi Medeiros, lotado na comarca de Quixadá, diz que a categoria sente falta de um suporte por parte da administração do Tribunal de Justiça relacionado à saúde mental de servidores e magistrados. “A gente ainda está vivendo um momento de pandemia. Há relatos no mundo todo de transtornos mentais, principalmente, a Síndrome de Burnout, que está relacionada ao excesso de trabalho.

“Tranquiliza-nos saber que o debate está em voga e que essa situação não é apenas retórica, que realmente precisa ser debatida, para evitar que outras tragédias venham a acontecer e, nas situações de crise, a gente saiba como contornar, qual a forma de trabalho mais efetiva, sempre visando o ser humano que está ocupando o cargo. Em Quixadá nós sofremos uma enorme pressão por causa da carência de Oficiais de Justiça, que é uma situação que só pode ser resolvida pela administração”, frisou.

Estudantes de Direito

Para Jhamylla Scarany, estudante do 7º semestre do curso de Direito, a palestra foi interessante e engrandecedora. Ela, que é estagiária da 1ª Vara Cível de Quixadá, considerou o momento oportuno para debater o tema e disse que a presença dos palestrantes foi de suma importância, com falas necessárias. Ela defende a realização de mais palestras abordando saúde mental voltadas para estudantes de Direito.

Preservação de vidas

Palmira Peixoto, lotada em Senador Pompeu, comenta que as doenças mentais afetam toda a sociedade e, quando essa realidade é levada à categoria, observa-se que muitos Oficiais de Justiça estão passando por problemas sérios por causa da defasagem registrada em todo o Estado. “Muitos estão na comarca, lidando com uma demanda que seria de três, quatro oficiais(alas). Além da enorme quantidade de mandados há uma cobrança reiterada pela devolução das medidas, devidamente cumpridas, no prazo de 20 dias, tudo isso vai nos sobrecarregando. Eu, por exemplo, sofro de depressão e transtorno de ansiedade e tenho que lidar diariamente com essa pressão”, relatou.

A oficiala acrescenta que iniciativas como essa são essenciais para a preservação da vida de cada servidor e magistrado, assim como para a qualidade do serviço ofertado à sociedade.

Além das expectativas

Michele de Castro, oficiala de Fortaleza, disse que a palestra a surpreendeu positivamente, superando as suas expectativas, e que foi muito informativa e enriquecedora. “Espero que seja só o pontapé inicial de muitas ações coordenadas no sentido de preservar a saúde mental do servidor público do Estado do Ceará, que realmente necessita. Já era uma situação necessária de ser cuidada, mas com a pandemia se tornou urgente”, diz.

Destaca, ainda, que as informações passadas na palestra, de experiências exitosas como a do Vidas Preservadas, o qual se tornou um programa permanente do Ministério Público do Ceará (MPCE), demonstram com clareza que iniciativas aparentemente pequenas podem ter grande impacto na vida das pessoas, e que esse é o objetivo. “A Comissão Corrente da Vida, criada pelo Sindojus e alguns Oficiais de Justiça, nos quais eu me incluo, estão aqui para pensar e buscar soluções nesse sentido. Realmente é um marco, um momento de reflexão”, enaltece.

“Espero que seja só o pontapé inicial de muitas ações coordenadas no sentido de preservar a saúde mental do servidor público do Estado do Ceará, que realmente necessita”, diz a oficiala Michele de Castro

Para fechar a palestra, Carla Barreto, integrante da Comissão Corrente da Vida e uma das organizadoras do evento, fala que desde o início do deslocamento de Fortaleza para Quixadá agradeceu, sobretudo, pela presença, “que é uma palavra feliz que lembra que o presente de fato é uma dádiva e que é um presente estar aqui (ali, naquele momento)”. Para ela foi um alívio encontrar tanta sensibilidade e cuidado, e disse que cada palavra foi escolhida com muita sabedoria para que esse assunto seja tratado e para que cada um que estava ali, presente, possa tratar da saúde mental e de suas vidas com essa sensibilidade que faz falta.

“Nós precisamos nos cuidar, porque lidamos com problemas muito sensíveis de outras pessoas. O que nos une é o fato de que pessoas estão com as suas liberdades e as suas famílias muitas vezes colocadas em risco, portanto, cabe a cada um de nós colaborar para garantir o direito dessas pessoas. O que a gente deseja é que realmente nós sejamos capazes de desacelerar, de olhar nos olhos uns dos outros e perguntar em algum momento estratégico se está realmente tudo bem, de oferecer um abraço, acredito que são nesses gestos que a gente começa a perceber o que vale mais a pena para cuidar de si, do outro”, finalizou.

Curso Guardiões da Vida

No cotidiano, seja no ambiente de trabalho ou familiar, pode-se trabalhar na identificação de sinais que indiquem se a pessoa pode estar em um estado suicida. Para tratar sobre a identificação desses sinais e saber como agir, o Sindojus e a Comissão Corrente da Vida realizarão, no dia 20 de setembro, o curso Guardiões da Vida, voltado para Oficiais de Justiça e demais servidores e colaboradores do Poder Judiciário. O horário e o local serão divulgados em breve.

A formação será ministrada pelo tenente-coronel do Corpo de Bombeiros, Edir Paixão, especialista no tema. Em situações como essas, ele destaca que só com conhecimento é possível prevenir. “Conhecer para prevenir, treinar para salvar”, frisou.

Busque ajuda profissional

A vida é sempre a melhor solução” é o slogan da Comissão Corrente da Vida. Tristeza, perda de interesse ou prazer, sentimentos de culpa ou baixa autoestima, sono e apetite alterados, cansaço e falta de concentração são sintomas de depressão. Caso esteja com alguns desses sintomas, lembre-se que para todo problema há solução. Não hesite em buscar ajuda profissional.

Em Fortaleza, esse apoio é prestado pelos Centros de Atenção Psicossocial (Caps) e por unidades como o Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto (HSM) e o Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC). É feito atendimento também no Programa de Apoio à Vida (Pravida) da Universidade Federal do Ceará (UFC): (85) 3366.8149 e (85) 98400.5672. E de forma remota pelo Centro de Valorização da Vida (CVV), por meio do número 188 ou pelo site www.cvv.org.br.

Nos casos de urgência e emergência, deve-se acionar a Polícia Militar do Ceará (PMCE) pelo 190, o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) no 192 ou o Corpo de Bombeiros Militar do Ceará (CBMCE) no 193.

Confira o vídeo com alguns momentos da palestra em Quixadá:

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Luana Lima

Jornalista

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