Psicóloga destaca que é papel do gestor viabilizar ambientes com segurança psicológica aos seus trabalhadores
Patrícia Passos destaca três estratégias de enfrentamento muito comuns para lidar com fatores de risco e situações estressoras: protetivas, adaptativas ou exploratórias
Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam que, em 2030, a depressão deve se tornar a doença mais comum do mundo, afetando mais pessoas do que qualquer outro problema de saúde, incluindo câncer e doenças cardíacas. As informações foram divulgadas em setembro de 2019, durante a primeira Cúpula Global de Saúde Mental, realizada em Atenas, na Grécia. O dado serve de alerta para todos os países, principalmente ao Brasil, onde o número de pessoas com transtornos mentais revela uma segunda pandemia. De acordo com o Datasus, o número de óbitos no país por lesões autoprovocadas dobrou nos últimos 20 anos. Foram 6.780 em 2000, saltando para 14.084 em 2020, sem considerar a subnotificação.
Diante desse cenário mundial de aumento de casos de transtornos mentais e atento à situação dos servidores do Poder Judiciário, neste Setembro Amarelo – mês dedicado à campanha de conscientização sobre a prevenção do suicídio –, o Sindicato dos Oficiais de Justiça do Ceará (Sindojus-CE) entrevistou a psicóloga Patrícia Passos, idealizadora do Programa de Saúde do Trabalhador do curso de psicologia da Universidade de Fortaleza (Unifor), para saber quais medidas devem ser adotadas pelos gestores no sentido de elaborar políticas públicas que permitam o correto enfrentamento do problema e a sua prevenção, sobretudo, no ambiente de trabalho.
Relação do trabalho com a saúde mental
A especialista destaca que é papel fundamental do gestor viabilizar ambientes com segurança psicológica para os seus trabalhadores. Ela comenta que, nos casos de suicídios que ocorrem no ambiente de labor, a literatura diz que tem tudo a ver com essa relação com o trabalho e que há ambientes de trabalho que são nocivos à saúde mental. Por isso, reforça a importância de que seja dado espaço para que as pessoas possam falar, apresentar as suas dificuldades, porque “onde há medo não há possibilidade de crescimento, de criatividade, de inovação”.
“No serviço público não há o medo da demissão, mas há o medo sim de você ser ridicularizado, de não ser aceito no grupo, de mostrar a sua vulnerabilidade. Pessoas vulneráveis são avaliadas como não aptas para estar em determinados cargos”, observa Patrícia Passos.
No caso do Oficial de Justiça, a psicóloga – que já desenvolveu Oficinas de Escuta com a categoria – destaca que, de um modo geral, a sociedade olha para esse servidor com a ideia de “glamour”, pelo fato de ter uma boa remuneração e horário de trabalho flexível, mas quando se tem conhecimento das dificuldades que enfrenta no dia a dia da profissão, dos locais em que precisa se inserir, da insalubridade da atividade que exerce, da sobrecarga de trabalho e das constantes cobranças para dar conta de uma demanda que muitas vezes é humanamente impossível de ser atendida, observa-se que estão em intenso sofrimento e alguns até em adoecimento psíquico.
Estratégias de enfrentamento
Para fazer frente à possibilidade cada vez maior do desenvolvimento de transtornos mentais, os quais foram potencializados pela pandemia da Covid-19, Patrícia Passos fala de três estratégias de enfrentamento: protetivas, adaptativas ou exploratórias. Ela explica que as protetivas são aquelas realizadas fora do ambiente de trabalho. Fazer meditação; procurar ajuda profissional de um psiquiatra ou psicólogo; fazer terapia; praticar atividade física; ter uma alimentação balanceada; ter uma boa rede de apoio: amigos e colegas de trabalho com quem a pessoa possa contar; e desenvolver atividades interessantes, como “hobbies”, exemplifica. “Teve gente que na pandemia se descobriu na culinária, na jardinagem, no artesanato, são medidas protetivas”, diz.
Outra estratégia de enfrentamento às situações de risco à saúde são as adaptativas, de a pessoa pensar junto à gestão e aos colegas de trabalho estratégias que possam beneficiar a todos. No caso dos Oficiais de Justiça, acrescenta a psicóloga, seriam estratégias adaptativas para se adequar às exigências. Como exemplo cita: “se eu tenho uma equipe com 10 pessoas e quatro estão em licença médica, as demais vão ter que cumprir esse trabalho, então elas ficarão com excesso de demanda. Como organizar e distribuir o trabalho de forma equitativa, para ninguém ficar sobrecarregado e até para quem saia de licença não se sinta culpado”.
A psicóloga ressaltou que maior parte desses afastamentos são por adoecimento psíquico e não por problema físico. “O percentual de licenças médicas é muito por depressão, transtorno de ansiedade generalizada ou transtorno do pânico”, afirmou.
Existem também as estratégias de auto-exploração. “A gente ouviu um Oficial de Justiça dizer que trabalha de domingo a domingo”, pontua Patrícia. Ela explica que existem algumas estratégias em que a pessoa se explora, porque quer dar conta do trabalho, porque é comprometida, mas reforça que existem situações que são inaceitáveis. “A gente tem realmente que colocar um limite e isso cabe ao próprio trabalhador, estabelecer um limite e dizer: eu não vou trabalhar aos domingos, não vou cumprir mandados e nem certificar aos domingos”, alertou.
A especialista finaliza dizendo que é preciso avaliar quais estratégias são as mais adequadas para cada pessoa, quer sejam protetivas, adaptativas ou exploratórias para lidar com os fatores de risco e as situações estressoras. “Dessa forma a gente vai prevenir adoecimento e prevenir essa situação máxima do sofrimento psíquico, que é retirar a própria vida”, diz.
A partir de solicitação feita pelo coordenador da Central de Cumprimento de Mandados Judiciais (Ceman) de Fortaleza, Wagner Sales, foram realizadas, em março de 2019, pela Seção de Capacitação do Fórum Clóvis Beviláqua em parceria com o curso de Psicologia da Unifor, duas Oficinas de Escuta voltadas para oficiais e oficialas da Capital. Na oportunidade puderam relatar os riscos, o intenso fluxo de demandas, além do desgaste físico e emocional a que estão submetidos diariamente no trabalho, gerando estresse e ansiedade.
Comissão Corrente da Vida
Em maio do ano passado, o Sindicato dos Oficiais de Justiça do Ceará (Sindojus-CE) criou a Comissão Corrente da Vida, formada por representantes da entidade e oficiais e oficialas de Justiça voluntários, com o objetivo fortalecer essa grande corrente em defesa da vida, com foco na promoção da saúde mental de Oficiais de Justiça e demais servidores e colaboradores do Poder Judiciário.
Entre as ações que já foram desenvolvidas estão o Treinamento Guardiões da Vida, realizado nas comarcas de Quixadá e Fortaleza; e a palestra “Saúde mental no trabalho”, em Caucaia. As iniciativas foram realizadas em parceria com o Corpo de Bombeiros Militar do Ceará (CBMCE), por meio do tenente-coronel Edir Paixão, mestre em saúde pública com atuação na identificação e intervenção de pessoas em risco de suicídio; e do Ministério Público do Ceará (MPCE), por meio da promotora de Justiça Karine Leopércio, coordenadora do Programa Vidas Preservadas.
Programa Vida em Equilíbrio
Dois meses depois de tomar posse, o presidente do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), desembargador Abelardo Benevides, anunciou o Programa Vida em Equilíbrio, com foco na saúde física e mental, e no equilíbrio entre vida pessoal e profissional de servidores e magistrados. O lançamento do programa foi marcado por uma palestra com o historiador Leandro Karnal, em maio deste ano, na Escola Superior da Magistratura do Ceará (Esmec). Conforme informação da Secretaria de Gestão de Pessoas (SGP), o programa tem investimento anual de R$ 1.989.068,44.
A administração deu início também aos grupos terapêuticos, os quais oferecem acolhimento e escuta especializada a servidores e magistrados. Os encontros são quinzenais, sempre às quartas-feiras, com duas horas de duração. De acordo com a SGP foram realizados até o momento sete encontros com a categoria dos Oficiais de Justiça. Marcações de atendimento devem ser feitas pelo e-mail atendimentosaude@tjce.jus.br ou pelo Whatsapp (85) 98239-2513.
Busque ajuda profissional
Tristeza, sensação de vazio, sentimento de culpa, baixa autoestima, sono e apetite alterados, cansaço, falta de concentração, irritabilidade, além de interpretação distorcida e negativa da realidade são alguns sintomas de depressão. Caso você esteja sentindo algo assim, lembre-se que para todo problema há solução. Não hesite em buscar ajuda profissional.
Onde buscar ajuda?
● Plantão Psicológico ProVida – Sesa/CE
Canais de atendimento:
WhatsApp: (85) 98439-0647
● Site da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa)
https://www.saude.ce.gov.br
Clicar em Sou paciente depois em Atendimento de Saúde Mental.
● Centros de Atenção Psicossocial do Estado do Ceará (Caps)
Acesse os telefones dos Caps disponibilizado pelo Programa Vidas Preservadas do Ministério Público do Ceará – AQUI
● Centro de Valorização da Vida (CVV) – Atendimento 24h
Endereço: Rua Ministro Joaquim Bastos, 806, Bairro de Fátima
E-mail: https://www.cvv.org.br
Fone: 188
● Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Ceará – Núcleo de Busca e Salvamento
Endereço: Av. Presidente Castelo Branco, 1000, Moura Brasil
Fone: 193
● Hospital de Saúde Mental de Messejana
Endereço: Rua Vicente Nobre Macêdo, s/n, Messejana
Site: www.hsmm.ce.gov.br
Fone: (85) 3101.4348
● Programa de Apoio à Vida (Pravida/UFC)
Rua Capitão Francisco Pedro, 1290, Rodolfo Teófilo
Site: www.pravida.com.br
Fone: (85) 3366.8149 / 98400.5672
● Laboratório de Relações Interpessoais (Labri/UFC)
Avenida da Universidade, 2762, Benfica
E-mail: labriufc@gmail.com
● Instituto Bia Dote
Endereço: Av. Barão de Studart, 2360, Sala 1106, Aldeota
E-mail: www.institutobiadote.org.br
contato@institutobiadote.org.br
institutobiadote@gmail.com
Fone: (85) 3264.2992 / 99842.0403
● Instituto DimiCuida
Endereço: Av. Santos Dumont, 1388, Aldeota
Site: www.institutodimicuida.org.br
E-mail: fabiana@institutodimicuida.org.br
Fone: (85) 3255.8864 / 98131.1223
● Centro de Apoio ao Sujeito no Luto (Casulu)
Rede social: facebook.com/casulupsi
Fone: (85) 3109-6616 / 99996-7447