Especialista afirma que ao tratar os transtornos mentais é possível ter uma política eficaz de prevenção do suicídio
Conforme Fábio Gomes de Matos, psiquiatra e coordenador do Programa de Apoio à Vida da UFC, existem cinco tipos de transtornos que podem levar ao suicídio, sendo a depressão o principal deles
Neste 10 de setembro, Dia Mundial de Prevenção do Suicídio, o Sindicato dos Oficiais de Justiça do Ceará (Sindojus-CE), por meio da série Sindojus Saúde, chama a atenção para um tema que ainda é tabu na sociedade: o suicídio. Fábio Gomes de Matos, psiquiatra e coordenador do Programa de Apoio à Vida (PRAVIDA) da Universidade Federal do Ceará (UFC), destaca que a campanha Setembro Amarelo tem como objetivo alertar e conscientizar a sociedade de que é possível, sim, prevenir o suicídio. Ele destaca que a imensa maioria dos casos está ligada a transtornos mentais, portanto, ao tratar esses transtornos é possível ter uma política eficaz de prevenção ao suicídio.
Conforme o especialista, existem cinco tipos de transtornos mentais que podem levar ao suicídio, sendo a depressão o principal deles. Tem também o transtorno bipolar, que embora acometa um número menor de pessoas (em relação à depressão) é o transtorno, em termos percentuais, mais associado ao suicídio. Tem ainda os relacionados a algumas substâncias, a exemplo de álcool, maconha, craque e cocaína. O transtorno de personalidade, especialmente borderline. E a esquizofrenia, que de acordo com o psiquiatra, graças a uma medicação fantástica que há no mercado, há cada vez menos pessoas esquizofrênicas que se matam.
Oficiais de Justiça
No caso dos Oficiais de Justiça, o próprio desempenho da função é responsável por agravar esses tipos de doenças. A violência urbana e os altos índices de criminalidade são fatores que contribuem para o aumento do número de casos de depressão e da síndrome do pânico, transtornos mais comuns na categoria, conforme ficou constatou nas Oficinas de Escutas realizadas com Oficiais de Justiça de Fortaleza em março de 2019. Somado a isso, tem as diversas situações que estes servidores passam no exercício da função, a partir das reações imprevisíveis por parte dos jurisdicionados.
A psicóloga Patrícia Passos, da Universidade de Fortaleza (Unifor), destaca que ficou muito evidente nas Oficiais de Escuta que o Oficial de Justiça tem um trabalho intensificado, bem diferente de um servidor que chega às 8h e sai às 15h. “Eles têm que trabalhar nos feriados, fins de semanas e em horários diferenciados para dar vazão às demandas. Tem bastante cobrança e pressão. Essa sobrecarga de trabalho acaba gerando adoecimentos. É um trabalho que envolve risco de violência, de assalto, de terem armas apontadas para eles. É um trabalho solitário, pois cumprem os mandados nas ruas sozinhos. Tem também o estresse decorrente do trânsito, de locais inacessíveis e perigosos”, comenta.
Além disso, ela acrescenta que é um trabalho que exige da categoria muitas competências. “Tem horas que eles vão cumprir o mandado e a pessoa cai no choro. Tem horas que tem que retirar uma criança da família, então, além de Oficial de Justiça, eles disseram que precisam acolher o sofrimento do outro. É uma profissão que requer muito equilíbrio emocional”, frisa.
Sinais de alerta
Dessa forma, estar atento aos sinais de alerta é fundamental para evitar que a pessoa cometa uma atitude drástica. Entre eles, o professor Fábio Gomes de Matos cita a desesperança, quando a pessoa acha que a situação não vai mudar. Desamparo, não ter ninguém que a apoie. E o desespero, ela achar que a única solução é aquela, quando não é. “A vida sempre tem soluções melhores do que o suicídio”, reforça.
Diferente do que se pensa, o psiquiatra esclarece que é um mito achar que falar de suicídio vai fazer com que a pessoa cometa suicídio. A pior coisa que pode acontecer, no entanto, é ela negar o problema, pois não haverá chances de tratar. “É preciso abordar o assunto e se disponibilizar a buscar ajuda, pois abdicar desse tempo pode ser tarde demais”, diz. Em um primeiro momento, complementa o especialista, é comum a pessoa achar que pode lidar sozinha com aquele problema, quando não pode. “Quem está pensando em suicídio é porque todos os recursos já se esgotaram”, disse.
“Enquanto tem vida tem alternativa, quando você morre não tem mais alternativa. É preciso agir e procurar ajuda, não se pode jogar o problema para debaixo do tapete”, frisa o psiquiatra Fábio Gomes de Matos
Fábio Gomes de Matos reforça que o suicídio não é alternativa, pelo contrário. “Enquanto tem vida tem alternativa, quando você morre não tem mais alternativa. É necessário que a gente tome algumas atitudes, então vamos tomá-las. É preciso agir e procurar ajuda, não se pode jogar o problema para debaixo do tapete”, alerta.
Pandemia
Com a pandemia da Covid-19, a Secretaria da Saúde do Estado (Sesa) afirma que foi observado um aumento da procura pela emergência do Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto (HSM) visto que houve o surgimento ou o agravamento de transtornos psiquiátricos relacionados ao período pandêmico, principalmente ansiedade, depressão e dependência de álcool e outras substâncias.
“Nossa atenção à prevenção do suicídio é ainda mais importante agora, após meses observando os fatores de risco presentes, como violência doméstica, sentimento de perda de entes queridos, medo de adoecimento, dependência química, entre outros”, relata a psiquiatra Gleicianne Gadelha, coordenadora do HSM.
O coordenador do Programa de Apoio à Vida da UFC informa que o desemprego aumenta em 15% as taxas de suicídio no mundo inteiro. Dessa forma, se o Brasil tem 14,8 milhões de desempregados – conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) –, têm-se pelo menos 2,2 milhões de pessoas em risco. É importante lembrar que não é só o desemprego. “São divórcios, famílias mal estruturadas, relacionamentos tóxicos, perda afetiva, tudo isso pode ser uma causa importante de suicídio e a gente precisa estar junto dessas pessoas para que elas não façam esse ato tão drástico que é exterminar a sua vida”, ressalta.
Prevenção
Levar um estilo de vida saudável, evitar fazer uso de álcool e outras drogas, dormir oito horas por noite, praticar atividade física e ter uma alimentação saudável estão entre as medidas que podem ser adotadas para prevenir transtornos mentais. O professor Fábio Gomes menciona ainda a questão do estresse. “Tem que se evitar esse estresse exagerado, que às vezes a vida oferece, saber os nossos limites”, observa.
Caminhada pela vida
O coordenador do PRAVIDA faz o convite para que oficiais e oficialas de Justiça, assim como a população em geral, participem da tradicional Caminhada pela vida, que será realizada neste domingo (12), às 16h, na Avenida Beira-Mar. A concentração será em frente ao Ideal Clube, de onde segue até o Náutico Atlético Cearense.
Rede de atenção
Para todas as doenças existe tratamento, por isso a importância de buscar auxílio. Em Fortaleza, esse apoio é prestado pelos Centros de Atenção Psicossocial (Caps) e por unidades como o Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto (HSM) e o Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC). É feito atendimento também no Programa de Apoio à Vida (PRAVIDA) da Universidade Federal do Ceará (UFC): (85) 3366.8149 e (85) 98400.5672. E de forma remota pelo Centro de Valorização da Vida (CVV), por meio do número 188 ou pelo site www.cvv.org.br
No decorrer deste ano, o Sindojus Ceará, em parceria com a Unimed Fortaleza e outras instituições, desenvolverá ações voltadas para a saúde do Oficial de Justiça. É uma preocupação constante da entidade a busca por colaboradores e novos projetos visando a saúde e o bem estar da categoria. Esse diálogo já está sendo feito com a Unimed Fortaleza no sentido de que atividades sejam desenvolvidas abrangendo não apenas os transtornos mentais, mas a medicina preventiva como um todo.